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suicide watch is an intensive monitoring process used to ensure that an individual does not commit suicide.
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eu estava sentada a seu lado, um lugar de sofá no meio das duas, a minha mão a transpô-lo, pousada sobre o seu ombro, fazendo festas até onde chegavam meus dedos, querendo quase entrar por sua pele para chegar dentro, fundo onde lhe gritavam as vozes que não ouvia eu, que não ouvia ninguém senão ela, que lhe ensurdeciam o falar e lhe emudeciam o ouvir;
e por isso o toque, o tentar do toque, o toque desesperado por chegar dentro, dentro até que minhas mãos tapassem a boca a essas vozes injustas e mentirosas que empurravam aquela alice de cabelo de fogo para o buraco mais fundo de si,
longe de tudo,
de todos,
longe de tudo o que é
vida na vida.
" you see..
i wasn't supposed to be alive by friday......"
disse-mo em murmúrio,
como quem fala do que é certo,
sem caminho de regresso.
um segredo que me confiava como quem confia tudo.
e eu tive vertigens de sua morte planeada.
...
falava-me por entre os soluços que lhe rasgavam o respirar,
sem nada mais que não o negro da côr imensa de si, esse escuro de facas afiadas e comprimidos engolidos por anos de injustiça, desamor, desconsolo.
e eu pensei
pensei
que não é justo.
a balança a tornar-se mais e mais desigual a cada dia
e nós sem saber, sem saber o peso de cada hora.
o peso de não saber-se de si.
de perder-se,
deixar de ser-se
esse tudo
que se é.
e tão fácil, a queda.....
frente a meus olhos caía, e eu sabia que ela caía de olhos fechados, cerrados como punhos, e assim se deixava ir, sem responder a ninguém, sem levantar a cabeça para olhar-nos, já, sequer, nada de si senão aquele corpo de menina por si mesma abandonada e aquele choro angustiante, sufocante, sumido,
a contaminar-me o sangue de tristeza e revolta.
inadmissivel não pegar nas mãos de quem nelas segura seu próprio presente e levantá-las até que veja, saiba, sinta tudo o que é, pode ser, sempre, a cada dia, cada minuto, ainda, sempre,
a vida.
querer abaná-la e dizer pára, pára as vozes, pára tudo o que te atormenta, mergulha para fora de ti se preciso for que te agarramos, nós agarramos-te,
só não vás.
não assim.
não antes de
tanto de ti.
mas ela menina, enrolada em si mesma,
pequenina pequenina,
pequenina de medo e tão adulta de dor...
medo de quebrá-la, quase...
cuidar como se,
porque,
pássaro de asas partidas.
alimentar.
ser guarida.
dar descanso.
sem paredes brancas, médicos ou vozes estranhas.
sem o medo de nada.
sem o nada lá fora.
sem curso de nada para além do sentir.
nada senão cada momento.
agora.
na quietude da noite dormiu como quem se entrega ao descanso dos braços de uma casa, amigo, porto de abrigo.
na luz meiga do dia pegou-me pela mão e levou-me por seu labirinto de árvores entrelaçadas em nós enferrujados de memórias escuras e flores murchas de seu próprio abandono,
e pelo enevoado do medo consegui ver que olhava ainda para cá.
para nós.
dentro.
olhava.
falei-lhe das luzes que alumiam o dia,
das velas que se apagam para que possa vir a noite que descansa, apazigua, ameniza, serena...
deixa que venha a noite, serena.
que te seja sereno o dia.
todos os dias.
deixa...
o que se pensa é só isso,
um pensar.
a vida toda é um pôr-do-sol
uma mão dada no escuro
o mar.
..
(imagem de john tenniel)