sábado, julho 28, 2007

tired.






É muito o que te podia dizer.

Para além das palavras houve sempre o nosso olhar, o nosso amor, mas a desilusão de hoje cega-me o querer, castra-me as mãos, prende-me os olhos que pudessem fugir para olhar-te ainda.

É como se de repente fosse tão óbvio, o escuro à nossa volta... Que eu não quis ver. Desde que tu.

Tão óbvio que de mim se apodera e me esconde num quarto sem porta, onde deixas – deixaste há tempo demais – de me ver.
Mesmo se eu.

Porque te admiti sempre os meus erros,
eu,
como os meus medos, esses segredos – olha, ajuda-me, tenho vergonha mas. E quero mudar.


E tentei sempre ajudar-te. Por mais que.
Sempre.


E nunca te abandonei.
Nunca.
Nunca, quando de mim precisaste e me permitiste sabê-lo, eu te abandonei.
Nunca.

Por isso parto de coração limpo, a olhar tudo o que não seja o passado. Bom ou mau.
Tu agora mostraste-me o que sou em ti, o desenho que pintaste de mim, a recusa em viver quem sou.

E eu agora vou compensar-me por tudo.
Agora vou aprender
comigo
e com quem.

Sim, eu agora vou ser feliz.

E vou-me embora.
Agora chega.
Agora nunca mais.

























(tens razão... é tempo de partirmos.

o amor já não existe como quando, e é escusado fingirmos que algo, alguma vez, vai ser parecido ao que podia ter sido.
que imaginámos em segredo.
em conjunto.
em nós.



parto.
agora sou eu a partir.

tenho uma vida a viver. a construir.
tenho eu de me libertar das correntes de mim própria.

e agora nunca mais te peço ajuda.
agora que aprendi a não ter vergonha de. contigo.
agora não quero
não quero
que te aproximes.

não tenho palavras ou gestos para ti.



tenho uma vida a viver.
uma alma a consertar.

tenho uma mágoa enorme cá dentro
com o teu nome
o teu espaço
a tua promessa
em mim.
ocupou-se de tudo.
ocupaste tudo
- tu
tudo -
com esse empurrão de sentir.
agora.
agora que.
logo agora que.



por isso parto
antes mesmo de partir.

parto de mim
em ti.

parto de nós.



guardo-te dentro.
acho que para sempre.
ou até que.

tenho uma vida a viver.




“do you really think you go to hell for having loved?”



tenho uma vida a viver.
sem ti.




sem nós.

como tu.)


















(imagem de sam lawrence)

sexta-feira, julho 27, 2007

(a)o pé da partida.






















volto à minha escola de adulta-menina.
visito quem fui.

durante 5 anos, estas paredes me viram crescer cair reviver amar mudar de vida trocar de amor aprender coisas conhecer quem sou namorar crescer.

aqui fiz amizades para uma toda vida
e é tão estranho estar de volta que podia chorar.
pelo que não volta, nunca mais.
e no entanto a felicidade, a liberdade, o ar puro de agora.
que dantes, aqui, eu não via, não sentia, não sabia em mim.
mesmo se os outros.

sentávamo-nos aqui, como outros, como estes que agora se sentam nas nossas cadeiras, às nossas mesas, nos nossos lugares.
daquela mesa lembro um silêncio que me fez perceber o amor da amizade.
nesta em que me sento, “o búzio de cós” me chegou à vida, e as palavras nele escritas à mão por essa menina de sempre em mim me fizeram saber a força e eternidade de tão inqualificável amizade.
com ela, por ela, o menino que vai ser pai a ser menino dentro, ele que a cada reencontro me lembra e faz saber que seremos sempre sorriso e cumplicidade.
para além da distância do tempo.
ou do tempo da distância – tanto me faz.

aqui pela primeira vez os ciúmes desse amor que eu não sabia,
mas que afinal.
ano após ano.
até que.

aqui vivi muito.
ri, partilhei, fui feliz.

aqui, nesse tempo, a partilha nos movia a nós, amigos maravilhados na nossa própria amizade.
mais, muito mais que qualquer outra coisa, qualquer outro querer,
nós queríamos dar, mostrar, partilhar.
queríamos ser.

por isso hoje – hoje – somos
conseguimos ser
ainda
nós.
em nós.

por isso sorrio, de lágrimas nos olhos,
a essa melancolia feliz do que não volta
mas é.
para sempre.
















(imagem: woman with umbrella, de michelle whitcomb)

terça-feira, julho 24, 2007

passo de dança. quieto.






















“ Tudo


Tudo me é uma dança em que procuro
A posição ideal,
Seguindo o fio dum sonhar obscuro
Em que do bem, às vezes, nasce o mal.

À minha volta sinto naufragar
Tantos gestos perdidos
Mas a alma, dispersa nos sentidos
Sobe os degraus do ar... “

(sophia)



porque não deixei que a revolta superasse o ser humana,
porque não deixei que o mau-sentir me sujasse coração e palavras,
porque não deixei que a hipocrisia de outrém ferisse quem sou,
eu ontem fui mais além
no caminho
- mais me-importante
que qualquer outro -
de tentar
sempre
ser uma pessoa melhor.

e isso enche-me de uma
quieta
certeza de vida
que me faz respirar
de sorriso
dentro.

nevertheless.

















(imagem: far away from home, de diong)

quarta-feira, julho 18, 2007

a vocês que me vê(e)m escutar marulhos

“ comovermo-nos é estarmos cheios de nós. ”

(vergílio ferreira)



..





aos que sei
e aos que não,
aos que em silêncio
e aos que em palavras,
obrigada.

por me encherem de mim.

convosco dentro.

como que um consolo
de força
e paz.
























...




mesmo.



















(imagem: asleep, de diong)

quarta-feira, julho 11, 2007

no tempo que sucede ao tempo.

"vai parecer que eu estou morto e não é verdade..."





foi há um mês.

um mês exacto.

"to the day", aqui se diz......






















estava claro.
a luz entrava pela janela do quarto branco
onde as enfermeiras te cuidavam.

eu esperei.
esperei à porta.
vi pela frincha o corpo que não eras tu
e doeu-me.
mesmo.
tanto como daquela vez em que te vi, herói, meu herói de coragem e bravura, a andares o máximo que ao longo daquele corredor de espera e choro que não havemos de esquecer nunca, nenhum de nós.
já aí o teu corpo não te obedecia. não te pertencia.
(tanto) depois disso, há um mês atrás, nada de teu te pertencia já.


porque foi (já) há um mês.
um mês desde esse dia em que me pediste liberdade.
em que me olhaste como quem não olha,
menino menino menino.
perdido da vida.
perdido de tudo.
a falares com a tua mãe, e eu a querer dizer-te que sim, que fosses com ela
- vai com ela, pai, não há mais nada para ti aqui.
não há mais vida cheia, há só vazio, dor, só confusão em ti.
vai, confia, abraça.
larga a minha, nossa mão.
vai.

...

..


foste.


.


era noite,
talvez manhã
- quem sabe o que, afinal?...

muitos meses antes do mês no dia de hoje
já eu chorava
aninhada nos braços do amor que então
então
porque sabia
eu sabia
- alguém não sabia? -
eu sabia
e perguntava
e ouvia
e chorava
e sabia do fim
sabia
eu sabia já
quando perguntava
a medo
por medo

"o meu pai está a morrer?....."

...

sabia.
que cada novo dia
era só mais um dia
em que te via

sabia
morrer.
na minha cabeça enleavam-se os "nunca mais",
e eu chorava
e sentia

e não queria
o perfume da morte,
esse de flores misturados sem cuidado nem cor
- um só cheiro que é cheiro nenhum.
e tudo isto tão antes do fim final....




e por isso não há - sabes? -, não há explicação, não há palavras para a coragem de ti, não há filme livro ou brisa que possam dizer, saber, o que foram aqueles dias, um atrás do outro, todos iguais, todos colados, todos piores, em ti.
ou.
que sei eu?
tudo me ficou nos olhos, dentro. desde aquele outro quarto, mais escuro, sim, mas tão mais cheio de espaço de
para
tudo.

tão mais tu, ainda...
tão mais livre.
tão mais vida.

porque nesse quarto, sabes, eu nunca soube o fim.
por mais que nele pensasse.
sentava-me à tua beira
e tu viravas-te para o meu lado
e confiavas-me o silêncio.

eu fazia-te festas.
porque nada mais.

e assim ficávamos
ficámos
muito
tanto
tempo....

e éramos tão família, ali, tão bonitos, quase, não fosse a sombra da dor, tão bonitos que me chora a lembrança, agora, o imutável nunca mais, mas nunca, ali, então, nunca - quero que o saibas porque, olha, eu acreditei sempre até onde era impossível acreditar, e ainda vivia um teu dia de cada vez, então - eu ali nunca te chorei.
por mais que agora.

o silêncio do desconhecido nos unia.
a impotência.

mais que isso a confiança
o amor

a não-desistência.

e tu soubeste, e eu soube, finalmente como se, nós soubemos o tudo que éramos um no outro.
e tudo isso,
pai,
me ficou para sempre.



.....




.



foi há um mês.
era dia.
estava sol.
era claro ainda quando te deixei no hospital sem querer.
quando chorei todo o caminho até longe.
quando não queria estar comigo nem ninguém.
quando disse

pela primeira vez
sobre ti
"não quero falar sobre isso".

porque já nada fazia sentido.
já nada me eras tu.
já nada fazia sentido
de ti para nós
de nós para ti
de ti para ti.



de madrugada
trocaste as voltas ao sentido
e foste.
deixaste o corpo e foste.
como o principezinho.
e a minha sorte, a minha sorte e arma contra a revolta da morte,
é ter sabido, a tempo e horas, pela boca desse um principezinho, que me disse, me lembrou ao ouvido "percebes? é que é muito longe e eu não posso levar este corpo... é pesado demais..."
































......











....









pois.








.











é só que......









......












parece-me só tempo demais
que tenha sido
um mês
(e tanto tempo antes disso...)
que te tenha visto
e ouvido
sem um adeus
pela ultima vez.

domingo, julho 08, 2007

in-between.

passeio a vida nas palavras que sinto
no tremor que confesso
e me torna o rosto incolor
o sonho ténue
os olhos mornos
de mim.


mostro
me
em silencio
a quem
perto
me quer
tanto.
sem mais nada.

cubro
tudo
de palavras
a quem
longe
tanto
me quer.

mas.
























(desafio.
me.
- se o dia acabasse
pela manha
de que cor
a saudade

do sol na pele
da pele nos outros
do mar vivido
do sonho de ti?)







......











...










“yo llore porque no tenia zapatos
hasta que vi un niño que no tenia pies”


oswaldo guayasamin





.













(imagem: llanto, de guayasamin)

quinta-feira, julho 05, 2007

(um) regresso.

volto lá.



















....


quando me lembrei de partilhar marulhos esse lá era o meu "cá".
este cá era o meu "lá".

..

e agora volto.


sem esperar nada, querendo só ser.
saber a vida, de longe, sentir se me fala de perto.

era aqui que vinha, quando. a minha casa, a minha terra.
agora vou ouvir o que me diz essa minha terra de outro lugar.

o liveearth vai fazer-me sentir vida.
é isso a música em mim.
mais ainda se ao vivo, no meio de tanta, tanta gente que o sente também.
é mágico.


vou talvez finalmente fazer o meu salto de paraquedas.
agora a fazer-me ainda mais sentido.
agora voando ainda mais alto.
com.



vou estar com amigos dentro, tão dentro como, que me sabem e confortam antes mesmo de eu o saber.


vou ver a minha outra cidade.
tão diferente.
tão, tão diferente...
e tão minha, também.
nevertheless.
tanto que tenho
mesmo
saudades.

.



disse-lhe
- a ver se me encontro, por lá....


e ele respondeu só
- dá-te um abraço meu, se te vires :)




....






e é só isso:





voltar.
agora.
respirar.
e perceber
saber
o que quero ser
e valer.



" Yo adivino el parpadeo
de las luces que a lo lejos,
van marcando mi retorno.
son las mismas que alumbraron,
con sus pálidos reflejos,
hondas horas de dolor.
Y aunque no quise el regreso,
siempre se vuelve al primer amor.
la vieja calle donde el eco dijo:
"Tuya es su vida, tuyo es su querer",
bajo el burlón mirar de las estrellas
que con indiferencia hoy me ven volver.

Volver,
con la frente marchita,
las nieves del tiempo
platearon mi sien.
Sentir, que es un soplo la vida,
que veinte años no es nada,
que febril la mirada
errante en las sombras
te busca y te nombra.
Vivir,
con el alma aferrada
a un dulce recuerdo,
que lloro otra vez.

Tengo miedo del encuentro
con el pasado que vuelve
a enfrentarse con mi vida.
Tengo miedo de las noches
que, pobladas de recuerdos,
encadenan mi soñar.
Pero el viajero que huye,
tarde o temprano detiene su andar.
Y aunque el olvido que todo lo destruye,
haya matado mi vieja ilusión,
guarda escondida una esperanza humilde,
que es toda la fortuna de mi corazón.

Volver... "









(poema de alfredo le pera
imagem de ana nicolau)