quarta-feira, março 28, 2007

memórias para um fim final

" Esperança e desespero de alimento
Me servem neste dia em que te espero
E já não sei se quero ou se não quero
Tão longe de razões é o meu tormento.

Mas como usar amor de entendimento?
Daquilo que te peço desespero
Ainda que mo dês - pois o que eu quero
Ninguém o dá senão por um momento.

Mas como és belo, amor, de não durares,
De ser tão breve e fundo o teu engano,
E de eu te possuir sem tu te dares.

Amor perfeito dado a um ser humano:
Também morre o florir de mil pomares
E se quebram as ondas no oceano. "

(sophia)





não posso dizer que te não amo.
mentiria.
e desde que te perdi pela mentira de nós,
da força de nós,
que recuso a mentira.
a passividade.
o abandono.
tudo me lembrará para sempre o amor mais importante,
de entrega
partilha
equilíbrio
universais
- e mesmo estas palavras serem tão pouco para o que tivemos nós...

era assim quase irreal, lembras-te?
ainda te lembras?
não dava para acreditar.....
quase divino.
talvez por isso condenado,
nós sem o sabermos,
meros humanos a quem foi dado tamanho sentir,
que rasgámos
ferimos
assassinámos
como se eterno.
ou nós.
nós que nem de nós mesmos conseguimos cuidar.
nós na cegueira do amor que se sente,
mas não é feito sentir.

eu prisioneira dos teus gestos
acções
palavras
esses espaços do nada que
a pouco e pouco,
de dor alucinante
em solidão dilacerante,
me definharam em mim,
me sugaram o coração de todo o sangue
e nos lançaram ao abandono do vazio.

e tínhamos tudo.

nós tínhamos tudo
para ser
e sorrir
de vida
feliz.

se tivéssemos acreditado.
ficado.
se soubéssemos que quem ama espera
- não trai definitivamente.
que mesmo depois de traído
quem ama não desiste do sempre.
da força.
mas tu.
tu que traiste o amor, a entrega,
o medo da morte e do fim.

tu que és tão sangue dentro
que não sei o que será de mim.


mas não posso.
não posso ficar.
ou esperar.
mesmo se te amo ainda,
com a dor em vida a pedir-te consolo,
tu que curas as feridas de ti
como se não fosse já nada,
eu....

...

a outros me entregarei.
como tu.

serei feliz.
como tu.

mesmo que a ti prove sempre
quem tocar meu corpo nu.












....






(clip extraído de: le fabuleux destin d'amelie poulain, de jean-pierre jeunet)

segunda-feira, março 26, 2007

sobre "os grandes portugueses":

que triste o pouco valor que se vai dando à liberdade que
hoje
temos...






















[AEPPA - Associação de Ex-Presos Políticos Antifascistas
Documento elaborado entre 25 de Abril e 30 de Setembro de 1974.]




...



ao realizador da rtp
por ter terminado o programa
num grande plano da imagem de zeca afonso
o nosso obrigada.
o deles,
também.
e tantos que.
porque não esquecemos.












.....









[Imagem (clicar sobre a mesma para melhor visionamento): pág. 67, de Mil Dias, Editora/Sérgio Guimarães, Diário de uma revolução, 1º Vol., sob direcção de Orlando Neves, com a colaboração de Carlos Pinto dos Santos, Carlos Osório, Eduardo Maia Cadete, José Carlos Vieira, Maria Carrilho, Mario Fabre e fotografia de Hernando Domingues.]

sexta-feira, março 23, 2007

é meu o grito desumano.
calado.
de não saber.
de mim ou ninguém.
de me ser amputado o gesto
quando estendo o braço a quem.

mas não desisto.
não me fico.

a minha força
é a do que sou.
da onda que limpa
e do mar que a criou.
se sozinha for,
sozinha vou.

a força tem de ficar.

como quem não desiste
e sonha o futuro.
como quem desafia
a morte no escuro.

a verdade é só uma.
ser forte é querer.
tudo o resto
mentiras
a trair o viver.


























....






(imagem: trying to fit in, de dale wicks)

quinta-feira, março 22, 2007

ao lutador.

um ano depois.


" Intervalo

Eu só quero silêncio neste porto
Do mar vermelho, do mar morto

Perdida, baloiçar
No ritmo das águas cheias

Quero ficar sozinha neste espanto
Dum tempo que perdeu a sua forma,

Quero ficar sozinha nesta tarde
Em que as árvores verdes me abandonam. "

(sophia)













...




se ao menos eu pudesse
tanto.












....






(imagem: soaring alone, de bill nyman)

quarta-feira, março 21, 2007

dia de.

à poesia
onda
ar
libertação
de mim

e aos poetas
que me embalam
regam
marulham
a vida
e os sonhos...

o meu obrigada.


(não ler este poema até ao fim
é um crime
que cometerão
sobre vocês mesmos.)



" Ode à Poesia


Perto de cinquenta anos
caminhando
contigo, Poesia.
A princípio
me emaranhavas os pés
e eu caía de bruços
sobre a terra escura
ou enterrava os olhos
na poça
para ver as estrelas.
Mais tarde te apertaste
a mim com os dois braços da amante
e subiste
pelo meu sangue
como uma trepadeira.
E logo
te transformaste em taça.
Maravilhoso
foi
ir derramando-te sem que te consumisses,
ir entregando tua água inesgotável,
ir vendo que uma gota
caia sobre um coração queimado
que de suas cinzas revivia.
Mas
ainda não me bastou.
Andei tanto contigo
que te perdi o respeito.
Deixei de ver-te como
náiade vaporosa,
te pus a trabalhar de lavadeira,
a vender pão nas padarias,
a tecer com as simples tecedoras,
a malhar ferros na metalurgia.
E seguiste comigo
andando pelo mundo,
contudo já não eras
a florida
estátua de minha infância.
Falavas
agora
com voz de ferro.
Tuas mãos
foram duras como pedras.
Teu coração
foi um abundante
manancial de sinos,
produziste pão a mãos cheias,
me ajudaste
a não cair de bruços,
me deste companhia,
não uma mulher,
não um homem,
mas milhares, milhões.
Juntos, Poesia,
fomos
ao combate, à greve,
ao desfile, aos portos,
à mina
e me ri quando saíste
com a fronte tisnada de carvão
ou coroada de serragem cheirosa
das serrarias.
Já não dormíamos nos caminhos.
Esperavam-nos grupos
de operários com camisas
recém-lavadas e bandeiras rubras.

E tu, Poesia,
antes tão desventuradamente tímida,
foste
na frente
e todos
se acostumaram ao teu traje
de estrela cotidiana,
porque mesmo se algum relâmpago delatou tua família,
cumpriste tua tarefa,
teu passo entre os passos dos homens.
Eu te pedi que fosses
utilitária e útil,
como metal ou farinha,
disposta a ser arada,
ferramenta,
pão e vinho,
disposta, Poesia,
a lutar corpo-a-corpo
e cair ensangüentada.

E agora,
Poesia,
obrigado, esposa,
irmã ou mãe
ou noiva,
obrigado, onda marinha,
jasmim e bandeira,
motor de música,
longa pétala de ouro,
campana submarina,
celeiro
inextinguível,
obrigado
terra de cada um
de meus dias,
vapor celeste e sangue
de meus anos,
porque me acompanhaste
desde a mais diáfana altura
até a simples mesa
dos pobres,
porque puseste em minha alma
sabor ferruginoso
e fogo frio,
porque me levantaste
até a altura insigne
dos homens comuns,
Poesia,
porque contigo,
enquanto me fui gastando,
tu continuaste
desabrochando tua frescura firme,
teu ímpeto cristalino,
como se o tempo
que pouco a pouco me converte em terra
fosse deixar correndo eternamente
as águas de meu canto. "


Pablo Neruda


(Tradução de Thiago de Mello)

























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(imagem: poetry, de ?)

terça-feira, março 20, 2007

verdade(s).

eu agora só queria fugir.
pegar em mim, em tudo o que sou, e correr correr correr, correr até não haver mais areia para os pés, correr com tanta força que o vento se visse empurrado a desenhar-me lágrimas de olhos, e que essas lágrimas me furassem a pele, me rasgassem por dentro, me obrigassem todo o corpo a chorar.

eu agora só queria chorar.
chorar, chorar, chorar, chorar e chorar. só isso. não sei que mais liberte este sentir tão confuso, tão cheio de vazio, tão tudo de nada, tão seco por mim. que me não permito. e me não proibo. que vivo, só, e isso é tão pouco, parece tão pouco, tão nada, agora.

eu agora só queria dormir.
fechar os olhos ao mundo, fechar os olhos à dor. dormir para além dos outros, dormir para além de mim. sonhar?... só se o mar. não quero outro sonho que não o mar de mim. tudo o resto passa, tudo o resto vai. tudo o resto é sonho. tudo o resto é só o que não é para sempre.

eu agora só queria não ser.
não existir, por um bocadinho. não ser, não precisar, não saber. queria fundir-me num grito que tocasse o imenso presente de agora, me ensurdecesse, me fizesse não saber de mim, dos outros, de nada.

eu
agora
queria
que não existisse
nunca mais
o nunca mais.




























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(imagem: despair, de gwendalin qi aranya)

domingo, março 18, 2007

quotidiano(s).














toco o cobertor.
por debaixo a coberta, por debaixo o lençol, só depois a mão dele. mas sento-me à ponta da cama - não consigo chegar-lhe à mão. toco o cobertor, só – não consigo chegar-lhe à mão.

o tempo pára.
ali, o tempo não deixa passar a vida, não deixa sonhar o que vem. ali o tempo pára, e tudo o queremos, vivemos e damos é só nada.
é espera, só.
enlouquecemos à procura de saber o que esperamos, se isto ou, aquilo ou talvez, e não sabemos – nós não sabemos o que esperar.

há tubos por todo o lado, e o cheiro, o cheiro é tão característico, não de um sítio igual a este, mas este sítio igual a si mesmo, igual a este momento, a este nunca mais que custa a passar, esta verdade que nos faz reclamar, sem o direito, sem um sujeito que venha, saiba, diga. verbos, precisamos de verbos, acção, não é assim? ...... corrói-me por dentro tudo aquilo contra o qual nada posso – dêem-me coisas, dêem-me nadas para pontapear e castigar, como se. falta-me o ar, estou enjoada, socorro, a impotência mete-me nojo, a minha, eu que nada posso contra o sofrimento de, eu que nem sei dizer o que virá amanhã, se lhe devemos sorrir ou pedir que não chegue.


...


não largues a mão, não cedas ao medo
– ajuda o tempo a respirar

respira-o fundo, enconcha, marulha
– cala-te o frio que teima em chegar









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(imagem: afraid of the dark?, de peter kozikowski)

segunda-feira, março 12, 2007

life's a beach...














and then you live.



















(imagem: costa da caparica, 11.03.07)

sexta-feira, março 09, 2007

30 (parte 2: aquilo que fica)

agora
já tenho
um marco
físico
para os meus 30 anos.














...


obrigada
a ti
por todo o trabalho
acarinhado
que.

porque
não sei
mesmo
dizer
o tanto
que significa
em mim.




















....



e porque já algumas vozes
falaram
pediram
uma reposição,
aqui fica,
no mais indicado dos posts,
fotografias de telemóvel,
cá e lá,
música dos killers,
e muita noite em frente ao pc,
(maldito movie maker!!!!),
a brincar com o editar,
na não tão longínqua londres.
"eu longe".



quinta-feira, março 08, 2007

hoje celebro

a coragem
o direito
a maravilha

de ser mulher.





























....









(imagem: jeanne hebuterne with the hat, de amedeo modigliani)


terça-feira, março 06, 2007


















podia dizer-te que enlouqueço.
aos poucos, aqui, assim, sinto-me enlouquecer.
quando imagino o passado, o acreditar de tanto, o equilíbrio,
para além da vida,
o tudo que nunca conheceu ninguém senão nós,
podia,
podia dizer-te que duvido tê-lo vivido realmente,
que chego a duvidar de que algum dia tenhamos mesmo existido.
ou que tenha existido
eu
em verdade
em ti.

porque o canto do teu silêncio é mais claro que as memórias, mais perfeito que nós, mais forte que eu.

e sinto só
para além de tudo
a revolta.
a revolta de me não levantar, olhar a tua ausência nos olhos, fazê-la a ela sentir o medo, o terror, o veneno que.

mas a cada dia
a cada dia
de abandono
largo-te de nós.
roubo-te às memórias –
tu que não mereces,
tu que não lembras,
tu que não amas.

cubro o meu sentir
e ergo-me
hei-de erguer-me
sozinha.
seguir em frente.

desculpa
(ou não):
tenho um compromisso
de vida
com a vida de mim.








....






(imagem: letting go, de annekarin glass)

segunda-feira, março 05, 2007

instante inverso


















lamento-me
peno-me
traio-me
sem que o consolo chegue
sequer
a respirar-me
em vida.

e hoje
hoje
foi um
outro dia
de instantes
inversos
em que o amor
vestido de enganos
bordados a nada
me disse
adeus.








....






(imagem: lamento da gaivota, de graça morais (detalhe) )

sábado, março 03, 2007

3 de março.


sexta-feira, março 02, 2007

livres.


vinha com a menina dos olhos de mel rua abaixo, passámos a praça da ALEGRIA para acabar na avenida da LIBERDADE.

(gosto muito dos nomes de algumas ruas de lisboa (acredito que os haja um pouco por todo o portugal, mas falo do que me é mais perto, do que sei assim, de coração)... há coisa mais bonita que dizer que se mora na rua da esperança, na praça da alegria, avenida da liberdade ou praça 25 de abril?.........)

pelo caminho ela falava-me do envolvimento do meu pai no PREC, que eu desconhecia, mas que me encheu assim de um orgulho bem especial.
mais um.

disse-lhe adeus e pus-me a caminho do metro.
chegada aos restauradores, dei comigo no meio da preparação de uma manifestação, marcada para hoje pela cgtp...
nem de propósito.















e foi bom de sentir,
o calor da gente minha
o burburinho das vontades
o cheiro a vida
a força sanguínea
daquela
humanidade
toda
ali junta
em revolta
mas
e
também
camaradagem.















e
de lágrimas nos olhos
respirei a liberdade.

quinta-feira, março 01, 2007














hoje apetecia-me o passado.
assim mesmo,
sem vergonha
ou pesar.
hoje queria só
não ser hoje.
por debaixo dessa cama de amor encontro
caminhos de antes
escondidos do tempo
e da dor.
cuidados.
urgências do querer.
do estar.
o pó os transformou na certeza do que não volta
não vive
não é
para sempre.
e eu não quero

não aguento
saber.
quero só fechar os olhos
e dormir
dormir
dormir durante a batalha
do que se quer
e o que se tem
e acordar só

quando me lembrar
me vir
sentir
quem sou.
porque por mais que me rasgue
me fira
e vire do avesso
tu não virás.
por isso
por isso
fecho as mãos
dedo a dedo
aperto os olhos
lágrima a lágrima
e deixo mesmo
mesmo
de tentar

pintar
de vida
e côr
a tua ausência.








....






(imagem: alone, de ferenc j. haraszti)